O Tesouro Direto costuma suspender a venda dos títulos públicos quando o mercado financeiro passa por um momento de pânico, normalmente durante eventos pontuais dentro de crises políticas ou econômicas. O mês de maio e junho de 2017 e 2018 foram marcados por diversas dessas paralisações.

Essas suspensões podem ocorrer mais de uma vez por dia. Algumas podem demorar minutos e outras podem demorar várias horas. Leia o artigo para entender o que está por trás dessas suspensões do mercado de títulos públicos e que tipo de oportunidade ou risco ela produz nos seus investimentos.

Exemplo

Dois exemplos de longas suspensões ocorreram nos últimos dias 06 e 07 de junho de 2018. Nessas datas, o Tesouro Direto suspendeu suas atividades três vezes no mesmo dia.

Normalmente as negociações começam 9:30 da manhã através do site https://tesourodireto.bmfbovespa.com.br/ que fica dentro da bolsa de valores brasileira, que antes se chamava BM&FBOVESPA e agora se chama B3.

No dia 06 o Tesouro Direto já começou o dia suspenso, só iniciando suas atividades às 12:00. Já no dia 07, o Tesouro funciono por apenas 18 minutos durante a manhã e logo foi suspenso com expectativa de retorno para às 12:00.

Durante a tarde ocorreram mais duas suspensões. Nos dois dias, as atividades foram definitivamente encerradas antes das 18:00 que é o horário normal de encerramento.

Veja a tela que aparece quando você tenta comprar um título público no momento em que o Tesouro Direto está suspenso. Uma faixa vermelha no topo da página exibe o texto “Mercado Suspenso!”. Para o investidor descobrir o motivo da suspensão é necessário acessar outro endereço que é esse aqui,

Motivo da suspensão

O motivo mais grave para uma suspensão costuma ser a volatilidade dos juros. O próprio Tesouro não explica muito bem o que seria isso e a imprensa costuma tratar o assunto com superficialidade.

Vamos entender como isso funciona.

As taxas que o Tesouro Direto paga para os investidores que compram títulos públicos como o Tesouro Prefixado e Tesouro IPCA (com ou sem juros semestrais), podem sofrer pelo menos 3 mudanças no decorrer do dia e isso tem relação com a forma como o Tesouro define essas taxas para que os títulos se mantenham atrativos.

Para determinar essas taxas que remuneram os investimentos prefixadas, o Tesouro utiliza como parâmetro as expectativas do mercado sobre os juros futuros. Essas expectativas mudam a cada segundo. Podemos observar o comportamento dos juros futuros através das cotações dos contratos de “DI Futuro” que são negociados na bolsa de valores todos os dias úteis (fonte).

Normalmente, quem negocia esses contratos na bolsa são instituições financeiras como bancos, gestores de fundos de investimento, investidores institucionais e investidores estrangeiros.

Pessoas físicas costumam ficar fora desse mercado, pois o preço de cada contrato gira em torno de dezenas de milhares de reais (fonte). Mesmo assim as taxas negociadas nesses contratos de DI futuro influenciam a taxa que o Tesouro Direto pagará ao investidor que comprar títulos como o Tesouro Prefixado e Tesouro IPCA. As taxas que remuneram títulos privados emitidos por bancos como um CDB prefixado, também sofrem as influências das variações dos juros futuros.

As taxas dos contratos de DI futuro negociados na bolsa sofrem variações a cada segundo, exatamente como ocorre com o preço de outros ativos negociados na bolsa, como as ações.

Quando ocorrem fatos que abalam o mercado financeiro, provocando mudanças bruscas de expectativas sobre o futuro, incertezas sobre a economia ou pânico, os contratos de DI futuro são negociados com taxas maiores, seguindo a lei de oferta e demanda.

A lógica é simples de entender. Se você pretende emprestar o seu dinheiro para alguém e só poderá ter esse dinheiro de volta daqui a uma quantidade x de anos, qual taxa de juro seria justo cobrar ao ano? Você provavelmente observaria as incertezas, riscos e suas expectativas sobre o futuro econômico e político do país para determinar uma taxa que compense o empréstimo. Você também poderia observar quais taxas o mercado está praticando. Quanto pior sua expectativa sobre o futuro, maior tende a ser a taxa que você exige.

Como curiosidade, veja todos os contratos negociados na bolsa clicando aqui. Eles se diferem pela data de vencimento. Nessa lista você verá o contrato com vencimento em 2025 (2025-01-02). Esse contrato é chamado de DI1F2025. Veja o gráfico da sua cotação visitando aqui. Se você acessar entre 9:00 e 16:00 verá a sua taxa subindo ou descendo a cada 1 minuto.

Se o dia for de pânico no mercado financeiro, você verá fortes mudanças na taxa. Essas variações são chamadas de volatilidade. O principal motivo para a suspensão do Tesouro Direto é a alta volatilidade nos juros futuros que podemos observar nos contratos de DI futuro.

Neste nosso exemplo, a taxa do DI Futuro chamada de DI1F2025 indica a expectativa do mercado para a taxa básica de juros (Taxa Selic) de 2025.

Quando o mercado está pessimista sobre o futuro da economia do país, essas taxas futuras tendem a subir. Quando o mercado está otimista, ela tende a cair. Quando muitos eventos, fatos e notícias mudam as expectativas sobre o futuro com frequência, as taxas tendem a variar muito em um curto espaço de tempo e isso seria a volatilidade que aparece nos comunicados do Tesouro Direto.

Exemplo de mensagem exibida na página de avisos onde o Tesouro fala sobre os motivos das suspensões:

Por curiosidade, vamos observar a volatilidade no gráfico do DI1F2025, visite aqui. É necessário ativar o indicador de volatilidade. Clique no ícone que possui o desenho de um pequeno gráfico, que está do lado de um ícone de balança, na barra superior de ferramentas do gráfico. Você poderá ver uma lista de indicadores. Clique no indicador de “Volatilidade Histórica”. Uma barra inferior vai aparecer com um gráfico que sinaliza a volatilidade.

Veja um exemplo:

O gráfico mostra a alta da taxa de juro do contrato de DI futuro que vence em 2025. Essa taxa é utilizada como referência pelo Tesouro para definir a remuneração do título Tesouro Prefixado 2025. Outros contratos de DI futuro com outros vencimentos são utilizados como referência para definir taxa e preço de títulos e investimentos com outros vencimentos.

Observe no gráfico, o aumento da volatilidade provocada pela greve dos caminhoneiros e todas as consequências negativas que ainda estão sendo descobertas pelo mercado. O gráfico mostra que durante esse período, a taxa sofreu fortes variações. Foram essas variações que fizeram o Tesouro Direto suspender a venda de títulos 12 vezes no mês de maio (2018).

A primeira suspensão no mês de maio ocorreu no dia 17, dia em que já existiam rodovias interditadas pela greve dos caminhoneiros (fonte). Duas semanas antes já existiam protestos e avisos sobre uma possível greve. Veja a cronologia da greve visitando aqui caso queira comparar com o gráfico.

Depois da greve o mercado ainda avalia todos os prejuízos e consequências negativas que ainda iremos colher pelas decisões tomadas pelo governo. Outros eventos políticos e econômicos no exterior ajudam a elevar o pessimismo e isso produz consequências nos juros futuros.

O mais curioso é que um ano atrás (2017), também no dia 17 de maio, outra crise explodia no país fazendo o Tesouro Direto suspender suas negociações diversas vezes. Esse dia ficou conhecido como “Joesley Day”.

Após a divulgação dessa notícia aqui, o Tesouro Direto iniciou o dia 18 com suas operações suspensas. Enquanto as pessoas físicas compram títulos públicos pelo Tesouro Direto, as instituições financeiras compram títulos públicos através de leilões realizados pelo Tesouro Nacional. Até esses leilões foram suspensos (fonte). No mesmo dia a bolsa de valores acionou o “circuit breaker”, um mecanismo que suspende as negociações na bolsa por um determinado tempo.

Quando o Tesouro voltou a operar, títulos como o Tesouro IPCA 2024 que pagavam 4,99% ao ano passaram a ser ofertados com taxa de 6,01% ao ano. O Tesouro Prefixado 2021, que pagava 9,54%, passou a pagar 11,39% ao ano. No dia 19 ele atingiu 11,45% e depois começou a recuar gradativamente. Somente no dia 19/07/2017 a taxa retornou para um valor próximo do que era oferecido antes da crise (9,52% ao ano). Você pode ver o histórico de preços dos títulos baixando as planilhas do Tesouro Prefixado (LTN) e IPCA (NTN-B) visitando aqui

Em abril, um mês antes da crise gerada pela greve dos caminhoneiros, esse título Tesouro Prefixado 2021 oferecia uma remuneração com taxa de 7,85% ao ano. Agora, ele oferece taxas acima de 9% (9,39%). O DI futuro usado como referência para investimentos prefixados que vencem em 2021, como o Tesouro Prefixado 2021, se chama o DI1F2021 e o gráfico pode ser visto aqui.

O Tesouro Prefixado 2025 chegou a superar os 12% por algum tempo antes da primeira suspensão do dia 07. Se você considerar que a taxa Selic atual (junho/2018) está em 6,5% e o CDI registra 6,39% ao ano, uma taxa prefixada de 12% ao ano representa uma diferença muito elevada entre as duas taxas. É uma diferença rara de se ver. Não lembro quando foi a última vez que vi o Tesouro Prefixado oferecendo quase o dobro da taxa Selic ou da taxa DI (CDI).

Fiz um gráfico mostrando a variação da taxa do DI1F2025 (linha escura) e o CDI mensal anualizado que segue de perto da Taxa Selic (linha clara). Em alguns pontos eu medi a diferença entre as duas taxas desde 2011 (caixas azuis). Veja que por diversos momentos esse DI futuro esteve acima do CDI, mas como podemos observar, não é comum ocorrer uma diferença tão grande como essa de 90%.

Desculpa do Tesouro

O Tesouro utiliza como desculpa para a suspensão da venda de títulos, proteger o investidor da intensa volatilidade. Na verdade, o objetivo mesmo é proteger o próprio Tesouro, pois se os preços dos títulos fossem atualizados em tempo real, assim como ocorre com o DI Futuro, os pequenos investidores poderiam aproveitar esses picos de alta para adquirir títulos com taxas elevadas. Como você pode observar nos gráficos, os picos que representam as maiores altas duram pouco tempo.

Como a venda de títulos é uma forma de endividamento do governo (a população emprestando dinheiro para o governo) não é interessante para o governo que sua dívida aumente justamente quando as taxas estão mais elevadas.

Dessa forma, s suspensão do Tesouro Direto por volatilidade costuma sinalizar alguma situação de pânico no mercado que podem elevar as taxas de juros dos títulos públicos para níveis acima da média por um determinado tempo. A suspensão evita a compra de títulos nesses momentos de maior estresse no mercado.

Mesmo assim, os mais atentos podem aproveitar esses momentos entre as suspensões para comprar títulos com taxas acima da média, especialmente se acreditar que o estresse no mercado é algo exagerado e passageiro.

Julgar se existe ou não exagero, se o pânico faz ou não sentido depende de um pouco mais de dedicação, conhecimento e experiência que qualquer pessoa pode adquirir caso queira.

Como você pode ver, existem muitos detalhes sobre o investimento em títulos públicos. Muitas fontes de informação, sites e canais do Youtube tratam os temas importantes com certa superficialidade.

Para aprender sobre investimentos com mais profundidade, do básico até o avançado, recomendo a leitura da minha série de livros, visite aqui.

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